domingo, 12 de julho de 2009

Villa-Boa de Goiaz

Tânia Mara Cassel Trott [1]
Longe do Rio Vermelho.
Fora da Serra Dourada.
Distante desta cidade,
Não sou nada, minha gente.
Cora Coralina

Há tempos que queria conhecer a terra de Cora Coralina, que brinca com seu pseudônimo: Cora de coragem e Coralina de coral, da cor vermelha, fogo, paixão, arrebol. Cidade do meio-oeste do Estado de Goiás, onde a Serra Dourada é sua fortaleza e o Rio Araguaia corre logo ali.
Saímos cedo do Distrito Federal, meu marido e eu, num sábado ensolarado e ar friozinho. Pés na Estrada: curvas, lavouras, pessoas, cidades... Chegamos. Por onde entrar? Onde é o Centro Histórico? Ora. A cidade toda é conservada historicamente, as pessoas que ali vivem orgulham-se disso e fazem questão de relatar o seu cotidiano, contam sobre seus antepassados, quase sempre tidos como heróis, suas festas, suas crenças, seus desejos para si e seu lugar.
Andamos quase dois dias pela cidade: praças, músicas, becos, artistas, a Casa Velha da Ponte, sinos, a festa do Divino, o pôr do sol, o silêncio do Rio Vermelho.
Mas havia uma interrogação: como surgiu uma cidade dessas, num lugar tão distante para a época em que os meios eram precários?
Fiquei em Goiânia, a moderna capital, às 16 horas de domingo, impaciente, intrigada e só. Queria uma resposta e a encontrei na livraria mais próxima:
A cidade de Goiás, antiga Villa-Boa de Goiaz, que até o ano de 1933 ostentou a condição de capital do Estado, surgiu das povoações fundadas, em 1726, pelo explorador paulista Bartolomeu Bueno.
Nascida em decorrência do ciclo do ouro, a cidade atingiu o seu auge durante o século XVIII.
A partir desse período, o seu núcleo central foi assumindo aparência arquitetônica própria, que ainda hoje conserva, num estilo colonial condizente com as condições da região.
Encravada às margens do Rio Vermelho, num vale cercado por colinas, impossibilitada fisicamente de expandir-se, a cidade acabou por assumir um ar romântico imposto por contingências históricas e por força de sua situação geográfica.
Privilegiada no sentido de colocar as pessoas em contato permanente com os elementos da natureza, esse aspecto foi acentuado por seus riachos cristalinos e sua vegetação peculiar, suas ruas sinuosas e irregulares, suas ladeiras pedregosas, seus tortuosos e misteriosos becos, seus muros de pedra. Esses mesmos muros que alimentaram as lendas sobre os escravos que os construíram e sobre a existência de tesouros em pepita e ouro em pó, escondidos em suas fendas. Lendas que provocam a imaginação das crianças, juntamente com os outros casos que os mais velhos lhes contavam ao cair da noite, revivendo as tradições, tanto da África quanto de nossos aborígenes. O “contar casos” se constituiu numa tradição familiar que Cora Coralina faz reviver em sua obra. Em seus poemas encontramos o estilo oral desses “casos”, sem invencionices literárias, com simplicidade que caracteriza sua obra poética.
A poesia de Cora é um elo de permanência da tradição que vem dos tempos passados em busca da afirmação de uma brasilidade futura, conforme palavras da própria autora: “Geração ponte, eu fui, posso contar”.

In: Vintém de Cobre, meias confissões de Aninha

Amigos do Pés na Estrada, viajar é conhecimento, vivência e sempre tem aquele gostinho de “quero voltar”. Até.












[1] Professora de Língua Portuguesa - Colégio de Aplicação/UFSC

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